segunda-feira, 28 de março de 2011

Duas gafes e uma decepção




São Paulo, segunda-feira, 28 de março de 2011
Obama: duas gafes e uma decepção

CELSO CINTRA MORI

A visita do presidente Obama ao Brasil certamente teve muitas consequências positivas, mas que ainda não são visíveis fora dos círculos oficiais. Na visão de quem esteve de fora de eventuais negociações mais sérias, a visita foi marcada por um incidente, um cochilo e uma coincidência decepcionante.
A revista pessoal de ministros e outros representantes do governo brasileiro, além de ser intolerável do ponto de vista do princípio da reciprocidade que rege o direito internacional, constitui uma descortesia que ultrapassa a arrogância.
Não é, ademais, uma atitude inteligente imaginar que um ministro brasileiro fosse, de repente, sacar arma de fogo ou branca para atentar contra o mandatário visitante. A remotíssima probabilidade de que isso acontecesse é tão desprezível que não valeu a pena o vexame.
a ideia de citar Paulo Coelho no discurso do Theatro Municipal revela uma falha grave dos serviços de informação e da sensibilidade de observação dos representantes do governo americano no Brasil.
No mínimo, um cochilo do serviço de informações. Qualquer observador razoavelmente bem informado sabe que o escritor Paulo Coelho, com todos os méritos que possa ter como "best seller", não é uma unanimidade como literato entre os formadores de opinião brasileiros.
Perdeu o presidente Obama uma excelente oportunidade de se referir a Machado de Assis, mulato como ele, brilhante como muito poucos, e que só não foi unanimidade universal porque escreveu em português em época em que a tradução, edição e comercialização internacionais não haviam alcançado os patamares atuais.
Por último, a decepção corre por conta da coincidência. Foi durante a estadia no Brasil que o presidente Obama autorizou operações militares que, a pretexto de cumprir uma discutível resolução das Nações Unidas, bombardearam a Líbia e sua população civil.
Ninguém, ou melhor, muito pouca gente neste país, discute a execração que merece o facinoroso governo do ditador Gaddafi. Nem se discute que o mundo civilizado deveria fazer alguma coisa para impedir o massacre de insurgentes, que exercem o legítimo direito de resistência àquela ditadura.
Mas da nação que se pretende líder do chamado mundo ocidental e do presidente que fez toda a sua campanha com a pregação da paz e a promessa de contenção do belicismo se esperava alguma ação mais sofisticada que bombardeios.
Para jogar bombas contra populações civis, basta o Gaddafi.
Para construir uma solução madura e equilibrada na solução de um impasse da magnitude do conflito da Líbia, seria necessária a liderança de um estadista, com a eficácia da verdade, a coragem de contrariar a indústria bélica, a autoridade do exemplo e a crença de quem acredita realmente que a paz é melhor que a guerra.
Se esse estadista existe, não visitou o Brasil ultimamente.



CELSO CINTRA MORI, advogado, é coordenador da área contenciosa do escritório Pinheiro Neto Advogados.

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