terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Herança tribal faz a mulher falar 3 vezes mais que o homem

A ciência (quase) tudo explica...




São Paulo, terça-feira, 21 de dezembro de 2010


Comida e natureza humana

FRANCISCO DAUDT - fdaudt2@gmail.com.br

VOCÊ ESTÁ na savana africana há 100 mil anos. Sua tribo é pequena, as mulheres se reúnem para trocar informações sobre onde coletar raízes e frutos e trocar favores para ter com quem deixar seus pequenos enquanto se aventuram.
As mais faladeiras são as mais simpáticas, as mais capazes de estabelecer redes de informações sobre os lugares de coletas e as mais hábeis em proteger suas crianças.
A isso, Darwin chamou vantagem evolutiva. Essas mulheres deixaram mais filhos que as casmurras, as ensimesmadas de poucas falas. Não é de espantar que as mulheres de hoje falem pelos cotovelos, em média três vezes mais que os homens. Elas salvaram seus filhos. É algo que temos que aturar? Ou admirar?
E os homens? Mais musculosos, menos apegados às crias, iam à caça, silenciosos, comunicavam-se por sinais, para não afugentá-la. Traziam as preciosas proteínas, que nos deram cérebro diferenciado. Cansados, sentavam-se ao redor da fogueira em silêncio cúmplice, amizade de homem.
Não é de admirar que hoje, em torno da TV, tomem cerveja e urrem com os lances do futebol. Amizade de homem.
Nem raízes e frutas eram fartas, nem proteínas da caça eram fáceis. Havia substâncias nelas que se acumulavam no corpo como uma reserva de combustível: açúcares (carboidratos) e gorduras (lipídios). Se a turma passasse um tempo de vacas magras, o corpo se abasteceria deles.
Novamente aí entra Darwin a dizer: quem gostou mais de açúcares e gorduras deixou mais descendentes. Somos descendentes daqueles africanos que gostavam mais de açúcares e gorduras, pois os outros morreram de inanição.
Pense num cheesecake com base de farinha (carboidrato, manteiga e açúcar), coberto de queijo cremoso (proteína e gordura), arrematado com geleia de framboesa (açúcar e mais açúcar). Olhe a fatia gorda na sua frente. Repare no que ocorre com suas glândulas salivares. Estão indiferentes ou jorram água na boca só de você ler isto?
Agora, uma diferença: na savana, você tinha que ralar para pegar um pouco de proteína, de açúcar e de gordura.
Não havia obesidade entre nossos ancestrais, muito menos academias de malhação.
Você está lendo o jornal na poltrona. O telefone está ao alcance da mão. Nele está gravado o número do serviço de entrega da quantidade de proteína, gordura e açúcar que você quiser. O que acha que seus genes vão pedir? Que saia à caça? Que busque as amigas para saber onde ficam as melhores raízes e frutas? Toda a parte boa pode ser entregue em casa: a fogueira está lá, basta chamar os amigos para ver TV com cerveja e pizza; as mulheres estão na cozinha, conversando sem parar, sem ter ido à coleta -a coleta foi até elas.
É essa a armadilha que a natureza nos preparou. Ela nos seduziu para que acreditássemos que isso é a tal da felicidade.


FRANCISCO DAUDT, psicanalista e médico, é autor de "Onde Foi Que Eu Acertei?", entre outros livros

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